sexta-feira, julho 24, 2009

Marina Silva: “vou participar das próximas eleições no Acre...”

NELSON LIANO JR.

A senadora Marina Silva (PT-AC) chegou aos 51 anos de idade com uma disposição invejável. Apesar das cinco malárias e das três hepatites ela está com uma saúde de ferro. O carisma de quem está acostumada a grandes batalhas continua o mesmo dos seus tempos de movimento social. A experiência de ser ministra do Meio-Ambiente lhe conferiu um poder maior de argumentações em relação à Amazônia e a sua regularização fundiária. Não esconde a vontade de transformar o modelo econômico do Brasil e faz críticas abertas as limitações do governo do presidente Lula de implementar as mudanças necessárias. A sua fidelidade às questões am-bientais planetárias estão intactas. “Não vou mudar o meu comportamento por conta de eleições ou cargos políticos. Prefiro ser fiel aquilo que acredito”, diz Marina.

A Crise do Senado
A entrevista começou com a pergunta para a Marina Silva sobre a crise do Senado. “Acredito ser a minha posição a melhor para o Congresso Nacional e para a situação que estamos vivendo dentro do Senado. Manifestei essa posição dentro da bancada do PT e depois tive a oportunidade de expressá-la pessoalmente para o presidente Sarney (PMDB-AP) e, posteriormente, ao presidente Lula. Além das medidas que já foram tomadas e as investigações, o Sarney deveria pedir o seu licenciamento. Lula e a ministra Dilma Rousseff divergiram da posição da bancada. Mas a nossa posição foi reiterada através de uma nota distribuída pelo líder, senador Aloízio Mercadante (PT-SP). Os desdobramentos virão depois desse curto recesso parlamentar. No entanto, acho que devemos ir além e defendi a idéia de um debate interno envolvendo não só senadores e servidores da Casa, mas também com a participação de juristas e pessoas que trabalham no campo das instituições públicas e que tenham uma visão para uma reforma do Senado. O processo teria que contar com a participação dos diferentes segmentos da sociedade para se ter um reposi-cionamento da Casa. Com esse gesto aos poucos se iria retomando a credibilidade do Congresso Nacional”, afirmou.

Prejuízo eleitoral para Lula e Dilma
Quando questionana sobre os eventuais prejuízos políticos que o presidente Lula e a sua provável candidata à sucessão, Dilma Rousseff, poderão ter com essa “blindagem” do presidente do Senado a um ano das eleições, a senadora acreana explica: “eu acho que as medidas que devem ser tomadas não devem incluir um calculo de popularidade ou impopularidade. As medidas a gente toma se são corretas e justas. Eu sempre meço as minhas ações políticas por isso. Na área ambiental se eu fosse medir o que é popular dificilmente tomaria as posições que tomo. Eu posso fazer o julgamento daquilo que entendo ser o melhor para a sociedade. É assim que defendo alguma idéia e tomo essa ou aquela atitude”, definiu.

A discreta saÍda de Mangabeira Unger do governo
A senadora falou sobre a coincidência da saída do ex-ministro Mangabeira Unger do governo logo depois da aprovação da Medida Provisória de Regulamentação Fundiária na Amazônia. Os dois tiveram muitas divergências. “Ele já havia conseguido aprovar no Congresso a MP que transfere 67 milhões de hectares de terras públicas para particulares. Um patrimônio equivalente a R$ 70 bilhões. No meu entendimento, o Mangabeira tem uma visão equivocada sobre a Amazônia. Ele acha que quem veio para cá, indiferente dos expedientes utilizados para se apropriar das terras públicas, estava fazendo um grande favor. Eu não vejo dessa forma. A Amazônia é um lugar maravilhoso para se viver e quem veio para cá é que está recebendo um favor de morar nessa terra tão generosa. Quem vem deve se submeter as regras do Estado de direito. As posses pacíficas não estão sendo questionadas. O que questiono é a grilagem que vem sendo feita há muitos anos na Amazônia através ocupação violenta. A CPT tem dados que revelam mais de 250 assassinatos e 260 tentativas de mortes e nós temos hoje 1700 pessoas ameaçadas. A regularização fundiária repassa terras públicas que são patrimônio de todos os brasileiros para alguns poucos aumentarem o seu patrimônio individual e o Unger favoreceu esse tipo de concepção dentro do governo e colaborou para a sua aprovação no Congresso Nacional.

A luta continua para reversão da situação
Marina Silva mandou cartas ao presidente Lula pedindo que alguns pontos da MP fossem vetados. Apesar do seu empenho conseguiu que apenas um item fosse modificado. “É o meu dever de parlamentar continuar a questionar essa situação. Em qualquer país do mundo a doação de um patrimônio territorial equivalente a França e a Itália juntas deveria ser feita com mais cuidados. Temos que aprender a ter zelo pela nossa riqueza. O Brasil tem 350 milhões de área agricultável e mais de 50 milhões estão em repouso. Por isso, não há necessidade de expansão da fronteira agrícola para que nós sejamos uma potencia em termos de produção. Nós temos que aprender a manejar a tecnologia para nos tornar grandes produtores de grãos e carne sem destruir mais a Amazônia, a caatinga, o serrado e a mata atlântica. Infelizmente há uma visão atrasada de se querer ser o maior produtor de grãos e de carne do planeta utilizando a mesma tecnologia que os índios usavam para fazer roças de subsistência. Para uma comunidade pequena é possível, mas para ser o maior produtor não dá. Se avança sobre a floresta para se garimpar nutrientes. Se utiliza aquela terra oito, nove, dez anos e vai baixando a sua produtividade. Ao invés de se recuperar a terra se derruba mais florestas. No Brasil, segundo o Ministério da Agricultura, são quase 800 milhões de hectares de áreas degredadas que podem ser recuperadas. Na Amazônia são 160 mil km de áreas abandonas que podem ser recuperadas. Se utilizarmos as novas tecnologias nós podemos dobrar a nossa produção sem derrubar nenhuma árvore. O desafio é mudar o modelo de desenvolvimento, ter novos paradigmas para o crescimento social e econômico do Brasil”, explicou.


Lula não avançou
Será que os sete anos da gestão do presidente Lula dão sinais de mudanças dos paradigmas de desenvolvimento? “Existe uma dificuldade muito grande de setores do governo para dar início a esse processo. Durante a minha gestão no Ministério procuramos estabelecer uma dinâmica para avançar. Agora, a atividade produtiva que ficava a cargo do Ministério da Agricultura praticamente não andou nada. Esses setores continuam defendendo o velho modelo de desenvolvimento e tentando flexibilizar a legislação ambiental. Hoje o maior problema do governo é desqualificar a legislação am-biental e não aperfeiçoá-la para a sua adequada implementação. Há uma dificuldade dentro do governo Lula de ter essa percepção que o grande desafio para o Brasil é mudar o modelo de desenvolvimento. Ficam dizendo que não vai ter energia elétrica, que não vai ter agricultura e exploração de madeira, por causa da questão ambiental. Não é isso. Para se fazer um processo de transição do modelo predatório para o sustentável é preciso que haja políticas de governo capazes de incorporar esse viés. Ações do Ministério de Transportes, de Minas e Energia, de Agricultura, de Saúde e de Educação. É assim que se vai criando um processo virtuoso que leve em conta as novas posturas e práticas. Quando você veta o crédito aos ilegais estará dizendo que está ajudando quem é legal. E como é que se faz para ser legal? É fazendo reservas legais, recuperando as áreas degradadas e os cadastros de propriedade. Se as pessoas vêem que a lei está ali e não vai mudar terão que se enquadrar. O caminho vai sendo trilhado nessa direção. Senão o tempo todo fica o efeito sanfona, faz a lei e muda lei, as pessoas ficam sem um comando e sem credibilidade para o que está sendo dito. Então durante cinco anos que participei do governo nós tínhamos uma única palavra que era combater as práticas ilegais e apoiar as inicia-tivas produtivas sustentáveis. Mas infelizmente não dependia só do meu Ministério e sim dos setores que lidam com a agenda de desenvolvimento. As pessoas di-ziam que os licenciamentos demoravam e isso não é verdade. Quando entrei no governo havia uma média anual de 200 licenças e quando saí eram mais de 300. Nenhuma sendo ques-tionada na Justiça. Na verdade as pessoas reclamavam das exigências que precisavam ser cumpridas para poder conseguirem a licença.

Eleições no Acre
A maioria dos eleitores acreanos querem saber se a senadora irá concorrer à reeleição. Num primeiro momento ela responde que o futuro a Deus pertence, mas depois completa: “O problema é essa vontade que se tem de antecipar as eleições no Acre. Tenho feito criíticas a essa antecipação porque atrapalha o trabalho nos três anos que antecedem a eleição. Na eleição de prefeito já está se discutindo a eleição de governador. Os problemas que nós enfrentamos é a reeleição. Eu votei contra a reeleição para o executivo que foi aprovada no primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Acho que deveríamos ter o mandato ampliado para cinco anos e uma única possibilidade de disputa. Fica aquela impressão para a sociedade que o governante está agindo por motivos eleitorais e não faz aquilo que é preciso ser feito para o interesse público. Por isso, que estou admirando o governador Binho (PT) que está trabalhando com afinco e em nenhum momento colocou interesses subordinados a eleição. É uma pena que o mandato seja só de quatro anos se fosse de cinco ou seis anos poderia se ter um período para amadurecer as políticas públicas e depois cumprir com as suas funções no executivo”, salientou.
Insisto nas possibilidades dela continuar a sua atuação política no Senado depois de 2010. “Eu estou retardando essa discussão. Das eleições aqui no Acre eu vou participar como candidata ou como cabo eleitoral. A minha decisão é algo que estou amadurecendo porque graças a Deus sempre contei com o apoio dos acreanos. Não só dos que votaram em mim, mas daqueles também que não votaram e me criticam. Eles também me ajudaram nesses 25 anos de vida pública. Sou grata a Deus pelas oportunidades que tive para realizar o meu trabalho. No momento certo junto com o meu partido e a FPA vou estar ampliando esse debate sobre a minha candidatura. Agora, estou muito preocupada com a situação política no Brasil.


Desgaste natural de governar
Quero saber a avaliação de Marina Silva dos 10 anos de governo da FPA. Se o tempo não teria desgastado esse projeto político. “Desde o primeiro governo a disputa nunca foi fácil e tranqüila. A sociedade acrea-na faz a sua escolha e a disputa é intensa. Vejo que as pessoas cobram resultados nesses 10 anos e pedem uma mudança dos processos que estão em curso desde a ocupação do Acre. Ninguém faz uma mudança de 100 anos em apenas 10 ou 12 anos. Para que o Brasil chegasse a esse modelo predatório são cerca de 500 anos de história. As pessoas se esquecem de como era o Acre antes do governo da FPA. Mas considero isso natural. O modelo de desenvolvimento sustentável deve ser aprofundado aqui para que possamos produzir, gerar emprego e melhorar a qualidade de vida das pessoas, ao mesmo tempo, preservando a floresta. Mas é importante que as pessoas tenham esse olhar crítico para que possamos ir nos aperfeiçoando”, garantiu.

Religião
Indago os motivos que levaram Marina Silva, que foi iniciante de freira na Casa das Servas de Maria e, com uma trajetória política ligada à Igreja Católica, a ter se convertido ao evangelismo. “O processo de conversão da gente não tem uma explicação. A palavra de Deus diz que não é por força e nem por violência é pelo meu espírito. Paulo de Tarso teria continuado um judeu ortodoxo pelo resto da vida, mas num determinado momento se converteu ao cristianismo. Eu já era cristã e num determinado momento me converti à fé evangélica. Mas graças a Deus tenho uma relação de respeito e amizade muito grande pelos meus irmão católicos. Amanhã mesmo vou me encontrar com Dom Pedro Casaldaglia. E vou dar um testemunho para todas as Comunidades Eclesiais de Base do Brasil a convite do Dom Moacyr Grechi, em Rondônia. Porque como diz a palavra de Deus, onde estiver dois ou três reunidos em meu Nome, eu também estarei”, finalizou.

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