segunda-feira, janeiro 15, 2007

Trabalho de Sísifo por Moises Diniz*

Sísifo se fez presente na eleição para presidente da Câmara dos Deputados. Nele, eu enxergo Arlindo Chinaglia. Membro de um partido que já detêm a Presidência da República, Chinaglia e seus apoiadores vão se protegendo no argumento colonial das maiorias da Casa.
“Os deuses tinham condenado Sísifo a rolar um rochedo incessantemente até o cimo de uma montanha, de onde a pedra caía de novo por seu próprio peso. Eles tinham pensado, com as suas razões, que não existe punição mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.
Já deu para compreender que Sísifo é o herói absurdo. Ele o é tanto por suas paixões como por seu tormento. Se esse mito é trágico, é que seu herói é consciente. A lucidez que devia produzir o seu tormento consome, com a mesma força, sua vitória.
Toda a alegria silenciosa de Sísifo está aí. Seu destino lhe pertence. Seu rochedo é sua questão. Ele também acha que tudo está bem. Esse universo doravante sem senhor não lhe parece nem estéril nem fútil. Cada um dos grãos dessa pedra, cada clarão mineral dessa montanha cheia de noite, só para ele forma um mundo. A própria luta em direção aos cimos é suficiente para preencher um coração humano. É preciso imaginar Sísifo feliz”. Albert Camus

O Trabalho de Sísifo foi escrito para ilustrar os heróis que se agarram ao seu rochedo, que não olham para o cimo da montanha, que não vêem as curvas do terreno, enfim, para os heróis das falsas possibilidades, dos horizontes facilitados. Sísifo é o herói que subestima os deuses e que, fatalmente, e por isso, o condenam a refazer o trabalho de volta.

Sísifo se fez presente na eleição para presidente da Câmara dos Deputados. Nele, eu enxergo Arlindo Chinaglia. Membro de um partido que já detêm a Presidência da República, Chinaglia e seus apoiadores vão se protegendo no argumento colonial das maiorias da Casa. Velho discurso que alimentava os interesses dos barões regionais. As maiorias, construídas no cabresto, não permitiriam construir um consenso que levasse em conta outros fatores, além daqueles que embalavam o preço dos escravos, depois do ouro, do gado e do café.

O Brasil é outro. As minorias se tornaram maiorias, no próprio exemplo do PT, e os excluídos realizam o milagre de eleger um operário. A movimentação que faz o PT, no Brasil, depõe contra o seu próprio movimento histórico. O PT sabe que os problemas éticos e de ordem política, no primeiro mandato, envolvendo o congresso nacional, ainda transpiram na pele do povo brasileiro. Que é preciso tempo para sanar as feridas na memória da população. O movimento de Chinaglia é um bisturi nas mãos de um leigo.

Aqui no Acre, o PT elegeu o governador e 7 deputados estaduais, de 24. Mesmo com a maior bancada, o candidato a presidente da Assembléia Legislativa é o deputado Edvaldo Magalhães, do PCdoB, que elegeu 2 deputados. O PT daqui, além de apoiar a candidatura de Edvaldo Magalhães, é ainda o seu artífice. Aqui estamos construindo uma candidatura de conteúdo governista, mas com a participação da oposição, que têm menos de 1/3 dos votos no parlamento estadual.

Estamos compondo com a oposição, mesmo com a bancada da situação tendo maioria qualificada. Temos convicção de que a governabilidade é mais importante do que as paixões pessoais e os interesses partidários. Porque a governabilidade do nosso projeto significa mais vida diga para o povo. O povo vai deixando de se apegar às contendas políticas das partes e vai erguendo seu interesse para assuntos mais nobres. A sociedade evolui.

Chinaglia e os seus apoiadores não conseguem enxergar os exemplos daqui e de outros lugares do Brasil. Talvez, porque seja um estado tão pequeno, os petistas do Brasil não enxerguem a grandeza que se plantou por aqui, no estado de Galvez. Estão agarrados ao seu rochedo partidário e não percebem que o Brasil é bem maior do que isso. Que as misérias humanas, acumuladas em 500 anos de dominação, precisam de grandeza política e desprendimento partidário. Não percebem que o Brasil precisa que eles retirem as mãos do seu precioso rochedo e abracem o país.

E, para completar a tragédia, abrem espaço para que a direita volte às velhas denúncias de interferência indecente do executivo nas coisas do legislativo. O caso da liberação de emendas parlamentares é emblemático e repugnante. Chinaglia fez o Brasil voltar a discutir o primeiro governo Lula. Permitiu que a grandeza e o avanço político e até ideológico do segundo turno das eleições presidenciais fosse substituído pelo debate obscuro que dominava a imprensa no primeiro turno. Desenvolvimento nacional por negociação de cargos e distribuição de renda por liberação de emendas acelerada. Daria uma comédia, se não fosse trágico!

Por isso, a beleza política da resistência de Aldo Rebelo. O atual presidente da Câmara dos Deputados não está realizando um movimento de caráter partidário, até porque o PCdoB não tem o tamanho dessa movimentação. Aldo Rebelo pretende devolver o parlamento brasileiro para o nível de onde ele foi retirado. No seu movimento, Lula estava ganhando, até aparecer Arlindo Chinaglia. Aldo diz, claramente, que a harmonia e a independência dos poderes não podem ser apenas conceituais.

Aldo Rebelo conseguiu se aproximar das curvas do parlamento e suas armadilhas. Descobriu que o parlamento brasileiro é a expressão do seu povo, com as suas grandezas e as suas misérias. Que é possível, com sabedoria, quebrar alguns de seus espelhos, fazê-lo instrumento de conquistas e de ampliação dessas grandezas.

Só não esperava que as suas misérias aflorassem assim, tão miúdas, tão desnudas e tão escandalizadas. Continuará lutando para que Sísifo não faça rolar o rochedo. E que na descida não desnude as velhas feridas! Pois, na subida o rochedo tem dono, mas, na descida, é terra de ninguém... Por isso, todos pagam!

*Moises Diniz, 39 anos, neto de índios Ashaninkas, ex Irmão Marista, formado em pedagogia e deputado estadual do PCdoB no Acre.

Seja o primeiro a comentar

  ©Template Blogger Elegance by Dicas Blogger.

TOPO